Motivação
Ricardo Schütz
A motivação pode ser definida como o conjunto de fatores circunstanciais e dinâmicos que determina a conduta de um indivíduo.
A motivação é uma força interior propulsora, de importância decisiva no desenvolvimento do ser humano. Assim como na aprendizagem em geral, o ato de se aprender línguas é ativo e não Passivo. Não se trata de se submeter a um tratamento, mas sim de construir uma habilidade. Não é o professor que ensina nem o método que funciona; é o aluno que aprende. Por isso, a motivação do aprendiz no aprendizado de línguas é um elemento chave.
A motivação pode ser ativada tanto por fatores *internos* como *externos*.
A origem da motivação é sempre o desejo de se satisfazer necessidades. O ser humano é um animal social por natureza e, como tal, tem uma necessidade absoluta de se relacionar com os outros de seu ambiente. Essa tendência integrativa da pessoa é o principal fator interno ativador da motivação para muitos de seus atos. Por exemplo, se estivermos em um ambiente caracterizado pela presença de uma língua estrangeira, naturalmente teremos uma forte e imediata motivação para assimilarmos essa ferramenta que nos permite interagir no ambiente, dele participar e nele atuar. Aprender uma língua fora do ambiente de sua cultura seria como aprender a nadar fora d'água.
As características dos ambientes que freqüentamos representam fatores externos. Por exemplo, se o ambiente em que o aprendizado da língua deve ocorrer for autêntico e proporcionar atividades voltadas aos interesses do aprendiz, o grau de motivação será alto. Entretanto, se o ambiente carecer de autenticidade, de elementos da cultura estrangeira, como por exemplo uma sala de aula com um número excessivo de alunos e um professor de proficiência limitada, onde a L2 dificilmente se impõe sobre a L1, e se as atividades nesse ambiente forem ditadas por um plano didático predeterminado em vez de centradas na pessoa e nos interesses do aprendiz, o grau de motivação será baixo.
Outra necessidade que buscamos satisfazer (principalmente crianças, adolescentes e jovens adultos) é a necessidade de se explorar o desconhecido. Esta característica do ser humano também demonstra a importância do ambiente de aprendizado da língua estar autenticado pela marca e presença da cultura estrangeira.
Na criação de ambientes especificamente para o ensino e o aprendizado de uma língua, mapas, fotografias, filmes e música podem ajudar, mas nada substitui a pessoa estrangeira. O falante nativo é a personificação da língua e da cultura estrangeira, e por isso forte fator estimulador da motivação. O contato intercultural mostra ao aprendiz a funcionalidade da língua e leva-o a se identificar com a cultura estrangeira e a desejar integrar-se a ela, produzindo, como conseqüência, o desejo de imitar, de pensar e falar igual.
Além de poder ser ativada por fatores internos e externos, a motivação pode ser classificada em direta e indireta.
Motivação direta seria aquela que nos impulsiona diretamente ao objeto que satisfaz uma necessidade nossa. Por exemplo: você admira e se identifica com uma cultura estrangeira e investe todos seus esforços no aprendizado da respectiva língua.
Motivação indireta ou instrumental é aquela que nos impulsiona em direção a um objetivo intermediário, por exemplo, aprender inglês, que, por sua vez, possibilitará a satisfação de uma necessidade maior. Esta é provavelmente a forma mais freqüente de motivação no aprendizado de línguas. Veja os exemplos abaixo:
Exemplo 1: Você tem um forte desejo de conhecer a técnica da fotografia e dispõe de excelente literatura sobre o assunto, em inglês. Embora você não entenda textos em inglês, vai aplicar todo seu esforço para decifrar a língua e assim obter as informações ali contidas.
Exemplo 2: Se um jovem norte-americano se apaixona por uma jovem de origem hispânica, que vive numa das muitas comunidades hispânicas nos EUA, ele poderá investir esforços no aprendizado do espanhol para conquistar a simpatia da jovem e de sua família.
Exemplo 3: Uma pessoa ambiciosa, extremamente motivada em direção ao sucesso em sua carreira profissional, embora sem talento nem motivação para línguas, poderá investir exaustivos esforços em seu aprendizado, o qual indiretamente, possibilitará a realização de um objetivo (satisfação de uma necessidade) maior.
Exemplo 4: Você busca o aprendizado da língua estrangeira porque reconhece nela uma ferramenta indispensável tanto em sua carreira acadêmica como profissional, ou simplesmente porque quer ser ouvido e reconhece no inglês um poderoso meio de expressão neste mundo globalizado.
É interessante observar que freqüentemente uma motivação indireta acaba dando origem à motivação direta. Ou seja, a pessoa inicialmente impulsionada em seu ato por um objetivo indireto maior, acaba "tomando gosto", descobrindo valores antes desconhecidos, destruindo imagens estereotipadas, encontrando no "sacrifício" intermediário um objeto de motivação direta. Isto ocorre na medida em que a experiência de aprendizado da língua é complementada com o aprendizado da respectiva cultura, passando ambos a fazer parte da coleção de experiências de vida da pessoa.
DESMOTIVAÇÃO
Se a motivação se origina no desejo de se satisfazer uma necessidade, não havendo necessidade, não haverá motivação. Pelo contrário, a reação normal da pessoa, quando compelida a uma atividade não resultante de um desejo de satisfazer uma necessidade, é a desmotivação.
Um ambiente de sala de aula voltada ao ensino formal de uma língua estrangeira, sem a presença de autênticos representantes dessa língua e de sua cultura, é um exemplo de ambiente que não evidencia necessidade, não produz motivação e não estimula o aprendizado. O que se encontra atualmente no ensino de inglês, são inúmeros fatores desmotivadores: salas de aula com muitos alunos, professores com proficiência limitada, cobrança através de exames de avaliação com questões truculentas que nada avaliam, repetição oral mecânica, etc. Esses fatores desmotivadores podem ser observados tanto na rede de escolas de ensino médio, onde o ensino de inglês ficou encalhado no método de tradução e gramática do início do século, como nos cursos particulares de línguas, que ficaram encalhados no método áudio-lingüístico dos anos 60. Nem um nem outro mostram resultados imediatos motivadores nem permite que o aluno alcance a proficiência desejada, gerando inevitavelmente uma certa frustração que, em maior ou menor grau, destrói a motivação.
Também aquele aprendiz que não se identifica com a cultura estrangeira, - ou que às vezes até a despreza, - normalmente por falta de maior informação a respeito da mesma ou por informações estereotipadas que o professor não soube corrigir, estará desmotivado a aprender sua língua.
O problema da desmotivação é freqüentemente observado em salas de aula que enfatizam /language learning/. Por outro lado, em programas que enfatizam /language acquisition/, observa-se facilmente a ocorrência natural de motivação para o aprendizado de línguas, independente de idade. A pessoa que tiver oportunidade de ter contato com a língua estrangeira em situações reais de comunicação, em ambientes autênticos dessa língua e de sua cultura, onde a língua está presente como meio de interação e não ausente, ministrada em doses pequenas e amargada pela repetição mecânica descontextualizada, ou pela dissecação gramatical, vai certamente alcançar fluência.
O caso do Jonas, narrado em nosso Fórum de Discussões em 24 de abril de 2003, é bastante ilustrativo:
"Fiz vários cursos no Brasil, inclusive todos os níveis (12 books). Mas quando vim para cá (EUA) pra morar e trabalhar, percebi como não era fluente em inglês, principalmente na parte oral. A minha motivação meio que baixou um pouco; eu me sentia frustrado. Como trabalho com informática, praticamente não conversava com meus co-workers. Mas com o tempo fui fazendo amizades e hoje acho que desenvolvi bastante."
Depois de 12 livros, cumprindo diligentemente a receita prescrita pelo curso, reprimindo a desmotivação com força de vontade, o aluno descobre ao chegar no ambiente de língua e cultura inglesa que não havia alcançado o objetivo principal. A desmotivação que ele sentiu foi uma espécie de efeito retardado, que outros, com menos força de vontade, não conseguem reprimir por tanto tempo e desistem antes do Livro 12. Só a partir do momento em que ele constrói um círculo de convívio humano, num ambiente autêntico, com situações reais de comunicação, é que reencontra motivação e finalmente alcança seu objetivo.
Isto nos leva à conclusão de que, em vez de nos preocuparmos em motivar nossos alunos, talvez devêssemos nos esforçar mais para não desmotivá-los. Se não pudermos despertar neles a motivação natural para o aprendizado de línguas, subjacente em todos, pelo menos cuidemos para não destruí-la e sim preservá-la para quando encontrarem a oportunidade certa.